IEC | Pós-graduação lato sensu PUC Minas

número 131 | 07/02/2021 a 31/03/2021

Destaque

Atento ou não às oscilações dos preços, está sendo difícil para o consumidor fazer o dinheiro durar o mês inteiro. A perda do poder de compra do salário, que assustou em 2021, foi confirmada pelo principal índice de inflação do governo. Segundo o IBGE, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), considerado a inflação oficial do país, apresentou alta de 0,73% em dezembro, acumulando aumento de 10,06% em 2021. E em janeiro, a pressão inflacionária continua. O preço dos alimentos subiu até 50% na comparação anual de janeiro de 2021 a janeiro de 2022, segundo pesquisa divulgada pelo Ibmec. Para responder aos questionamentos, convidamos a professora Vaníria Ferrari, economista.

De acordo com o IBGE, o resultado foi influenciado principalmente pelo grupo transportes, que variou 21,03% no acumulado do ano. Em seguida vieram habitação, com alta de 13,05%, e alimentação e bebidas, que aumentou 7,94% em 2021. Qual o principal motivo para que esses preços apresentassem tamanha evolução?

Hoje o Brasil está sofrendo uma inflação de custos, ou seja, o aumento dos preços que chegam ao consumidor final é reflexo do aumento dos preços dos insumos. Os insumos que mais sofreram pressão foram: combustível, devido aumento do preço do petróleo; energia, devido à crise hídrica; produtos commodities que foram impactados pela alta do dólar e produtos agrícolas, impactados pelas safras. Por isso, os setores que mais apresentaram alta nos preços estão diretamente ligados a esses fatores. Setor de habitação, devido principalmente ao aumento do custo da energia e material de construção; transporte devido aumento do preço do combustível e alimentação e bebidas, impactados pelo dólar e pelas safras menores de alguns produtos, por causa das condições climáticas.

A alta nos preços está sendo sentida em todo o mundo, mas o Brasil tem a terceira maior taxa do G-20, segundo os dados divulgados pela imprensa. Apenas Argentina e Turquia têm variação de preços superior à registrada aqui em 2021. Quais são as características próprias do Brasil que contribuem para a subida dos preços mais acentuada no País?

O principal motivo para que o impacto da inflação no Brasil seja maior refere-se a alguns fatores, como a desvalorização do real, uma das moedas que mais se desvalorizou em relação ao dólar; à elevada carga tributária; à infraestrutura logística e às condições climáticas. O aumento do dólar acarretou aumento do custo de insumos que são base para a maioria dos produtos. A infraestrutura logística já é um fator que, aliada à elevada carga tributária, gera custos elevados para as empresas, impedindo uma redução ou adequação de preços em momentos de crise. As questões climáticas afetaram a geração de energia, encarecendo-a, bem como as safras agrícolas, principalmente no sul do país. São características específicas do Brasil, que impulsionaram os preços.

Para o presidente Bolsonaro, a inflação é resultado da pandemia de covid-19 e da “política do fique em casa”, em referência às medidas de isolamento social para tentar controlar a disseminação do coronavírus. Você concorda?

A pandemia com certeza influenciou o mundo inteiro, tanto que estamos vendo economias de vários países sofrendo com as limitações e apresentando problemas de inflação, como a própria economia norte americana. Mas a pandemia não foi o único fator, foi com certeza um fator importante, mas outros aspectos ligados à estrutura econômica do país agravaram a situação.

Como a inflação atinge os diferentes atores econômicos?  Quais os riscos para o setor produtivo nacional?

Podemos dizer que os principais agentes econômicos são: empresas (que produzem e vendem bens e serviços), famílias (que oferecem mão de obra e consomem bens e serviços) e o governo. O Brasil passa por uma situação de fragilidade econômica, agravada pela pandemia. Temos uma realidade com elevado desemprego, o que afeta o poder aquisitivo da população, ou seja, o agente “família”. A elevação dos custos de produção afeta o agente “empresas” e, consequentemente, reflete no consumidor final. E a necessidade de aumento de gastos públicos devido a pandemia, agravam ainda mais a situação fiscal do país. O aumento do dólar, da energia e do combustível, afetam diretamente o setor produtivo nacional, refletindo em aumento dos custos. Por outro lado, estimula as exportações, pois uma moeda desvalorizada significa que os produtos nacionais ficam mais baratos para o mercado internacional. Já o aumento da taxa de juros visando conter a inflação, encarece o custo do capital para o setor produtivo. De fato, a inflação, e os fatores que a causam, afetam todos os agentes econômicos, gerando riscos para o setor produtivo nacional.

Segundo o IPEA, a inflação para os mais pobres é 15% superior à dos mais ricos no último ano. Por que especialistas dizem que é mais sentida pela população de baixa renda e como isso torna ainda mais cruel a realidade social de países desiguais como o Brasil? Especificamente sobre as famílias comuns, como elas podem se proteger dessa alta dos preços e da diminuição do poder de compra?

Quando falamos de inflação, estamos falando de perda de poder aquisitivo, ou seja, perda do poder de compra. E essa perda é mais sentida nas famílias de baixa renda, que são inclusive, as mais atingidas pelo desemprego. A melhor atitude das famílias nesse momento é ter cautela no consumo. Buscar gastar o essencial, e se possível formar uma reserva, independentemente do valor. Adiar investimentos, consumos e focar no essencial. Para aqueles que já possuem alguma reserva, proteger esse valor em aplicações mais seguras, que possam garantir o poder de compra, como investimentos em Renda Fixa.

Uma das opções que o governo possui é o aumento da taxa SELIC. Quais os principais efeitos dessa alta e suas consequências para o curto e longo prazos?

O aumento da taxa de juros como forma de controlar a inflação tem como objetivo conter a alta do dólar. Considerando que a alta do dólar é um dos componentes dos custos de produção, pressionando os preços para cima, o objetivo do aumento dos juros é conter essa elevação. Mas, como? O principal motivo que leva a um aumento do dólar é a retirada de capital estrangeiro do país, em busca de melhores remunerações a menores riscos. Se o país representa elevado risco e remunera pouco (taxa de juros baixa), esse capital estrangeiro tende a migrar para economias mais seguras, retirando moeda estrangeira e pressionando o valor do dólar para cima. Dessa forma, o governo, aumentando a taxa de juros, torna mais atrativo para o investidor estrangeiro, impedindo uma fuga de capitais e uma crescente valorização do dólar. Por outro lado, o aumento da taxa de juros eleva o custo do capital produtivo, podendo desestimular investimentos das empresas nacionais.

Para os próximos meses, como você avalia o comportamento da inflação no Brasil e nos itens Transportes, Habitação e Alimentos?

Segundo as previsões no último relatório FOCUS do Bacen, a SELIC deve permanecer em 2022 na casa de 2 dígitos, fechando o ano em torno de 11,75%. Com isso, o câmbio seria mantido em torno de R$5,60. A inflação, por sua vez, se manteria em 2022 acima dos 5%, fechando o ano em 5,44%. Dessa forma, percebe-se que a tendência é que não ocorram mudanças significativas no cenário atual. Ainda estamos atravessando um momento crítico, com a economia tendendo a recuperar-se de forma lenta e a pressão nos preços dos produtos finais e insumos ainda em alta. A palavra de ordem no momento é cautela. A possibilidade e expectativa de uma possível recuperação da economia não pode gerar uma empolgação por parte da população para aumento do consumo. O aumento do consumo é primordial para a recuperação do setor produtivo, mas deve ocorrer com responsabilidade e cautela.

Boletim produzido pela Assessoria de Comunicação da Diretoria de Educação Continuada da PUC Minas

imprensaiec@pucminas.br | (31) 3131-2824