IEC | Pós-graduação lato sensu PUC Minas

número 114 | 17/09/2019 a 22/10/2019

Opinião

Mônica Santos de Oliveira é ex-aluna do IEC. Aqui, ela abre seu coração para falar sobre a depressão em sua família. O texto inaugura a Coluna Opinião, que abre espaço para aqueles que desejam tratar dos temas que estão em pauta em nosso Boletim.

Depressão e suicídio em família

Por Mônica Santos de Oliveira, ex-aluna do curso de Pós-graduação em Abordagem Psicanalítica do Autismo e suas Conexões
monicaivo8@gmail.com

Conheci por aí pessoas com depressão que se trataram, que se tratam ainda e outras que não deram conta e se suicidaram, encerraram a vida por conta própria. Quero fazer parte do time que consegue se tratar e, mais do que isso, que consegue ajudar outras pessoas, que consegue falar e escrever sobre depressão. Enfim, quando a gente ajuda outras pessoas, também está se ajudando. 

Então é preciso falar de nós. A depressão com seus nós invisíveis que nos sufocam o coração sem que nossos olhos possam vê-la. Uma doença sem rosto e incapaz de ser diagnosticada através de ressonância, tomografia, radiografia, ultrassonografia, exames de sangue, fezes ou urina, mas que corrói o corpo físico.

Temos ouvido falar que é o mal do século XXI, mas, para mim, ela é o mal do qual estamos tendo coragem de falar no século XXI. Na minha família paterna se tem notícias desse mal desde o século XIX. Desde pequena ouvi falar de dois tios-avôs que tinham se suicidado por causa de depressão.

Tenho primos, irmã e outros parentes com depressão, mas quem mais me marcou foi meu irmão Renato, um ano e meio mais novo que eu. Ele sempre foi alegre, embora do tipo chorão, meio “lunático”, diziam. Renato era músico, tocava violão clássico e compunha, era dançarino de ballet do corpo de baile do Instituto Anna Pavlova, já jogou handebol até pela Seleção Mineira. Apesar de todos esses dons, optou por seguir a carreira médica com especialização em psiquiatria.

Recém-formado, meu irmão foi trabalhar no Hospital Santa Maria em BH e sua maior especialidade era o salvamento de pessoas que estavam à beira do suicídio, às vezes até já na hora do ato. Renato era casado, tinha dois filhos e a sensação que tenho é que ele largou tudo que fazia e mergulhou neste mundo dos doentes mentais. A depressão o atacou, ele se medicava por conta própria e foi aumentando a dose, durante muito tempo. Depois dos 45 anos, ele começou a não dar mais conta de cumprir os compromissos, foi demitido do hospital e mal, mal dava conta de seu consultório.

Após perder o emprego, outro irmão meu, também psiquiatra, o levou para se tratar em Goiânia, pois ambos não queriam que os seus pacientes e os profissionais daqui soubessem como ele estava. Em Goiânia, chegou a tomar até eletrochoque para ajudar no desmame das drogas que ele usava. Nada adiantou, e em dezembro de 2010, ele fugiu de casa de madrugada, comprou 90 comprimidos de Gardenal, se escondeu num motel e se suicidou.

Cheguei a trabalhar com Renato em seu consultório porque ele também era acupunturista e eu o auxiliava. Assisti a toda sua derrocada, e em alguns momentos ele dizia que se não desse conta, ele se mataria. Eu ficava meio em dúvida porque ele mesmo dizia que quem alardeia não faz. Para mim foi uma perda tremenda. Até nos dias de hoje me pego conversando com ele e o questionando por ter nos abandonado.

Quando estudei biologia e mais especificamente a genética, passei a ter como máxima a frase: a genética é infalível. Ao caminhar pela estrada da vida passei a achar que estava escapando desse destino, o que não se confirmou. Sempre fiz muitas coisas e, desde 2015, tinha uma rotina que envolvia cuidar dos outros: da minha mãe, que sofreu um AVC e ficou hemiplégica e do meu filho único, que tem autismo e epilepsia. Em 2018, meu companheiro há quase doze anos deu entrada no Hospital Luxemburgo para se tratar de um câncer de pulmão. Douglas morreu em agosto de 2018. Nenhum tratamento surtiu efeito e foi muito pesado, ele não conseguiu nem mesmo conversar sobre a doença.

Um pouco antes da internação de Douglas, me matriculei no curso de pós-graduação do IEC PUC Minas em Abordagem Psicanalítica do Autismo e suas Conexões. O primeiro sintoma da depressão que eu notei em mim foi o fato de eu continuar indo às aulas, mas ficar paralisada na hora de fazer trabalhos escritos. Amo escrever e tenho muita facilidade, tenho até um livro editado: Pedro Ivo – Autismo em Prosa e Verso, onde conto a minha história com meu filho. Mas, neste momento eu não estava conseguindo escrever. Depois passei a não dar conta de ler nada e, enfim, não estava mais dando conta de cuidar da minha mãe e do meu filho. Conversei com meus irmãos e com minha mãe e juntos achamos que seria melhor que ela fosse morar num Lar de Idosos, onde está agora. Ficamos eu e Pedro Ivo, mas até dele tenho dificuldade de cuidar. Estou me tratando com uma psicoterapeuta analista e também com um psiquiatra que me medica. Sigo acreditando e cuidando de mim e de quem me cerca. Meu conselho a todos e todas que estão me lendo é um só: não menosprezem esta doença. Ao menor sinal, nos outros ou em você, busque ajuda, ofereça ajuda e acredite.

Boletim produzido pela Assessoria de Comunicação da Diretoria de Educação Continuada da PUC Minas

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